Auditoria aponta risco à qualidade dos exames e à segurança no trânsito em Santa Catarina
Uma auditoria do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina (TCE/SC) divulgada nesta quarta-feira (26) revelou problemas graves no processo de credenciamento do Detran-SC entre 2022 e 2024. Entre os achados estão um médico credenciado já falecido, 86 médicos sem registro do título de especialista em Medicina do Tráfego no Conselho Regional de Medicina (CRM) e falhas no controle e na fiscalização das clínicas e profissionais que realizam exames para habilitação.
Principais achados da auditoria
O levantamento do TCE/SC inspecionou cadastros e documentos relativos a médicos, psicólogos e clínicas credenciadas pelo Detran. Entre os pontos divulgados:
Médicos e clínicas: entre 142 clínicas médicas credenciadas, 13 não possuíam nenhum médico com título de especialista em Medicina do Tráfego; duas estavam inativas; quatro não foram encontradas no site do CRM; e 12 apresentavam certificados vencidos. Além disso, um médico credenciado já havia falecido.
Títulos e registros: outros 86 médicos não possuíam título de especialista em Medicina do Tráfego registrado no CRM — especialidade necessária para atuar como perito examinador. Um dos médicos registrados no órgão de trânsito também não foi localizado no site do CRM.
Psicologia: dos 306 psicólogos credenciados, dois tinham registros cancelados junto ao Conselho Federal de Psicologia. Entre 154 clínicas psicológicas credenciadas, três não foram localizadas no conselho.
O TCE alertou que o baixo número de profissionais do Detran para fiscalização estaria abrindo margem para os “serviços inadequados” prestados à população.
Déficit de pessoal e impacto na fiscalização
O relatório detalha também a insuficiência de servidores para fiscalizar os credenciados: apenas três servidores eram responsáveis por fiscalizar 16.924 credenciados ativos, entre eles 139 clínicas médicas, 497 médicos peritos, 150 clínicas psicológicas e 403 psicólogos peritos, além de outros prestadores.
Segundo o TCE, seriam necessários ao menos 10 servidores dedicados exclusivamente à atividade de fiscalização. Em função do quadro reduzido, as vistorias só ocorrem quando há denúncia. Na avaliação do relator, “À vista disso, é incontroversa a insuficiência na fiscalização de credenciados pela Corregedoria, o que pode gerar a má prestação de serviços por parte de credenciados, a possibilidade de condutores sem formação adequada, o aumento do risco de fraudes e corrupção, e a exposição do cidadão a tratamento inadequado”, ressaltou o conselheiro José Nei Alberton Ascari em seu relatório.
Controle interno, TI e acúmulo de processos
Além das falhas no credenciamento e na fiscalização, a auditoria apontou problemas relevantes de governança e tecnologia da informação. O Detran e a Controladoria-Geral do Estado mapearam 55 riscos em um plano de integridade, mas apenas 27 classificados como altos ou extremos têm algum tipo de controle e acompanhamento. Das medidas mitigadoras previstas para riscos de alto ou extremo, apenas uma foi integralmente implementada até a data do levantamento.
A equipe de auditoria também identificou riscos não tratados desde 2022 relacionados à exposição indevida de dados, acesso indevido aos sistemas do órgão e possibilidade de vazamento de informações sigilosas.
No campo administrativo, o relatório mostra acúmulo de processos e prescrições: entre janeiro de 2022 e julho de 2024, 2.370 processos no Cetran e 494 nas JARIs tiveram penalidades prescritas. Havia, ainda, um estoque crescente de processos pendentes: cerca de 100 mil processos nas JARIs estaduais (com exceção de 2024) e mais de 42 mil no Cetran/SC em julho. Entre as causas, o TCE citou a não implementação de todas as JARIs previstas em lei, atraso na nomeação de membros julgadores e a existência de apenas uma turma no Cetran/SC para julgar recursos de todas as JARIs estaduais e municipais.
O TCE também verificou possível fracionamento indevido de reuniões do Cetran/SC, o que pode gerar pagamentos indevidos de jetons: em diversos dias foram realizadas quatro ou cinco sessões no mesmo dia, com duração inferior a uma hora cada. Segundo o relator, a fragmentação “pode resultar em pagamentos indevidos e aumento injustificado da despesa pública” e comprometer a transparência e eficiência dos trabalhos.
Determinações e resposta do Detran
Em sessão realizada em 19 de novembro, o TCE determinou que o Detran e o Cetran apresentem planos detalhando ações a serem adotadas, com prazos e responsáveis, no prazo de 60 dias. Entre as medidas recomendadas estão: maior controle sobre profissionais e clínicas credenciadas, exigência de formação específica por parte dos médicos, realização de fiscalizações presenciais a cada dois anos e ações para reduzir o estoque de processos e evitar novas prescrições.
O relatório destacou: “A providência é considerada fundamental para a melhoria da governança do órgão responsável por planejar, coordenar, fiscalizar, controlar e executar a política de trânsito no estado e do processo de credenciamento de médicos e de psicólogos”, destacou o TCE.
Em resposta à reportagem do ND Mais, o Detran informou que “recebeu o relatório do TCE na terça-feira (25) e está analisando as informações“.
Reflexão breve: responsabilidade pública e confiança
Como colunista e cristão, creio que a transparência e a competência nas instituições públicas são expressão de cuidado pelo próximo. Quando serviços essenciais — como os exames para a habilitação — apresentam falhas de governança, vidas e direitos ficam em risco.
A Escritura lembra a importância da responsabilidade: “Assim, pois, cada um de nós há de dar conta de si mesmo a Deus” (Romanos 14:12, NTLH). Essa responsabilidade também guia administradores públicos a prestarem contas com zelo e honestidade.
Que as determinações do TCE resultem em correções efetivas: mais servidores capacitados, processos transparentes e credenciamentos rigorosos. Só assim se garante segurança viária e respeito ao cidadão. — Leonardo de Paula Duarte
Fontes: relatório de auditoria do TCE/SC (dados 2022–2024) e posicionamento do Detran/SC comunicados ao ND Mais.

